NOÇÃO DE TECNOLOGIA VINCULADA À EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: UMA ANÁLISE DE LEGISLAÇÕES RECENTES

Resumo

No Brasil, a associação entre as noções de educação a distância e tecnologias na legislação não é recente. A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, no artigo 62, parágrafo 2º, estabelece: “A formação continuada e a capacitação dos profissionais de magistério poderão utilizar recursos e tecnologias de educação a distância”. Todavia, o Decreto nº 9.057, de 25 de maio de 2017, parece introduzir um elemento novo quando em seu artigo 1º restringe o desenvolvimento da educação a distância ao uso de tecnologias de informação e comunicação: “Para os fins deste Decreto, considera-se educação a distância a modalidade educacional na qual a mediação didáticopedagógica nos processos de ensino e aprendizagem ocorra com a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação (...)”. Neste contexto, o presente trabalho descreve o modo como a noção de tecnologia está presente em legislações brasileiras editadas a partir de 2017, as quais dialogam com o tema da educação a distância. Trata-se de uma revisão documental por meio da qual foram analisadas as Leis nº 13.415, de 16 de fevereiro de 2017, e nº 14.040, de 18 de agosto de 2020; o Decreto nº 9.057, de 25 de maio de 2017; e as Portarias MEC nº 20, de 21 de dezembro de 2017, e nº 2.117, de 6 de dezembro de 2019. Estas legislações foram intencionalmente selecionadas por apresentarem associações entre as noções de “educação a distância” e “tecnologia”. Os materiais foram analisados tomando-se como referência o ciclo composto por cinco fases sistematizado por YIN (2016) para a análise de dados qualitativos, ou seja: compilar, decompor, recompor (e arranjar), interpretar e concluir. Em termos de resultados, compreende-se que, predominantemente, a noção de tecnologia presente nas referidas legislações é aquela que remete às tecnologias de informação e comunicação (TICs), assim como no excerto extraído da Portaria nº 2.117/2019: “Art. 4º A oferta de carga horária a distância em cursos presenciais deverá incluir métodos e práticas de ensino-aprendizagem que incorporem o uso integrado de Tecnologias de Informação e Comunicação – TIC (...)”. Esta equiparação das noções de tecnologia e TICs, segundo a literatura, parece acarretar algumas dificuldades. A primeira delas consiste no fato de não existir consenso em relação à definição das TICs: Zara et al. (2021, p. 52) conceituam as TICs como “meios técnicos que permitem o compartilhamento de informações e os processos comunicativos por meio de recursos como computadores”; Carmo (2015, p. 13) escreve que as TICs correspondem “a todos os meios e processos que envolvem a comunicação humana”. Na primeira definição, percebe-se a vinculação das TICs às ferramentas e aos processos digitais; na segunda, o componente digital ou computacional não está obrigatoriamente presente. A segunda dificuldade decorre da primeira. Ao se conceber que as TICs não estão restritas às ferramentas e aos processos digitais, Afonso e Machado (2015) lembram que elas podem estar a serviço da educação presencial e da EaD, isto é, o seu uso não se restringe a processos educacionais “a distância”. Veloso (2012) lembra que a concepção de TICs como sinônimo de computador se constitui a mais disseminada socialmente. Pelo fato de os computadores não estarem disponíveis para todas as pessoas, aquela noção tem sido vinculada “à satisfação dos interesses de grupos e segmentos dominantes, contribuindo, em grande medida, para intensificar processos relativos ao aumento da acumulação de capital” (VELOSO, 2012, p. 3). Ao findar, lembra-se que apesar de as TICs se caracterizarem como a noção de tecnologia predominante nas legislações brasileiras recentes não existe consenso sobre a sua definição. Ademais, a identificação da associação entre as noções de TICs e computadores contribui para melhor compreensão das forças sociais que agem para configurar as políticas públicas de educação em nosso país.